
O resto é silêncio. É também o noc-noc dos sapatos como que
de passos jogados, arrastados a contra gosto; o snif-snif da coriza inevitável,
ali e aqui; o surdo tapinha nas costas enquanto crispa os lábios em apoio. Mas
o resto é silêncio. A passeata silenciosa que marcha de aperto no peito, marcha
sem querer chegar. Acompanhando o último trajeto, assistindo o carrinho fazer
suas curvas, a manobra, a última manobra. O coveiro dando instruções, dizendo a
direção, frio, corriqueiro. A dor alheia é a varanda da sua casa. É onde
frequenta, o que mais visita e desconhece. Empurra as flores, as amassa,
despetala-as. Brutal e mesmo, rotina de seus dias, ficar lá para o adeus. Bem,
sabemos não se abrir ali dentro os sorrisos que antes nos foram abertos, que os
olhos, ali, fechados não têm mais o brilho da vida, mas ele podia ter um pouco
mais de compaixão para com as flores que levamos, estas também ceifadas. Nós
que marchamos passo após passo, de coração comprimido entre os nossos braços
dados. Abobalhados diante da majestade, a vida. Espectadores de mais este
espetáculo que nos assalta, impotentes, em silêncio. Mais essa volta completa. E
só nos resta o respeito, os murmúrios, olhares; e olhares avermelhados. O
coveiro joga o cimento, tampa para sempre, veda, cela o destino. O cimento
trancando o que amamos. Como amamos se vamos embora deixando ali naquele lugar
horroroso? Os coveiros cimentando, as vozes tornando-se estridentes, o
desespero rasgando o dia, as pernas tremem, você perde o tino; é catarse. Silêncio
e catarse. Morreu. Foi-se e agora há cimento trancando para sempre. Meu Deus,
lá dentro, o
resto é silêncio. E você
chega a casa e tem sempre um a perguntar o número da sepultura a fim de
cercá-lo pelos doze.
Nenhum comentário:
Postar um comentário