sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Divorciada na lei de Deus


De novo as coisas de vezes milhares antes. E tornamos a levantar a taça de plástico com a sidra para o teto ainda não acabado de nossa residência. E você fazendo de conta que somos felizes. Todos os anos, me corrói o constrangimento da contagem regressiva na companhia de sua tia e de seus primos que são tudo o que temos de família. E você insistindo em ressaltar a nossa felicidade contada no número de carnês que adquirirmos com os últimos crediários do natal.  Você ostenta nossa nova TV enquanto eu combino os sofás de maneira que escondam as imperfeições do mofado nas paredes. Você faz questão de dizer que na sua casa todos comem a vontade enquanto sou eu quem vai ao mercado fazer milagre com meus R$250,00 de limite no cartão de crédito. Você se orgulha da sua árvore de natal, a montou enquanto eu selecionei cuidadosamente o lugar de sua disposição: em cima do piso que quebrou quando por último, depois de ter me jogado no chão, você lançou contra mim um casco de cerveja. Eu não suportaria ouvir você com uma fabulosa história sobre ter deixado um martelo cair. Por isso escondi. Para que não tivesse de ouvir sua tia perguntando sobre. Você dando sidra aos seus primos afinal estão ficando homens e precisam começar a seguir o seu exemplo como figura masculina mais próxima que eles têm. Eles me olham sorrateiros. Estão cansados de ser homens. Eu os fiz assim. Eu os ensinei a ser homens, a tocar numa mulher, a meter nela a encher a cama do marido dela de porra de moleques tarados e a rirem-se do galo de rinha metido a esperto. Eu lhes ensinei como calibrar uma arma e os ensinei a como dar fim a um merda suburbano e ordinário como você. Fui eu. Enquanto você brincava de polir o seu ego, brincava de ser macho sobre mim, de me fazer de seu pano de pia. E me enfiava a porrada e me arrancava tufos de cabelo e me dava roxos e verdes por todo o corpo. Enquanto isso, eu dei muito a minha boceta pros seus primos menores. Dei e você tão macho, tão dono de mim nem se deu conta de que veio me lamber suja deles ainda. Foi gostoso lamber porra de moleques tarados? Agora, o fim. Invertemos as posições das coisas: você chora as suas dores de já enxergar o Cão do outro lado, todo já receptivo de braços mais abertos que os do outro. Enquanto eu escancaro sorrisos doentios lutando entre a ansiedade de te ver morrer logo e o deleite de ver isso assim aos pingos de ora sim, ora não. Não olhe para cima. Você não tem nenhuma parte lá.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Me pergunto


Por que está teu rosto escondido
dentro do teu próprio braço?
E sussurras mui baixo, inaudível,
ao amante de um desesperado.
Como quem temesse ser surpreendido
nas redes de um amor avergonhado.
Como quem mesmo responde
Às questões que há pouco houvera sussurrado.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Harry & Hermione dançando de encanto

É bem um fato que muitos fãs do Harry sempre torceram pelo casal que intitula este post. Não é o meu caso, ora. Mas HP 7/1 pareceu dar algum consolo a toda uma turma que teve de ver seu sonho romântico descer pela descarga junto com a Murta que Geme desde a primeira advertência que o Rony tomou por certa sujeira em seu nariz.

Que o romance mais empolgante de toda a história era encabeçado por Rony e Hermione, ninguém jamais duvidou, ainda que torcesse contra. Mas o sentimento que envolve Harry e a mais adorável das sangue-ruins é ainda mais profundo do que o amor entre um homem e uma mulher.

Um parece conhecer a cabeça do outro e sentir o coração como o outro sente. Se entendem, se sabem e se amam a despeito de dividirem ou não um cama. Coisa que eles cansaram de fazer, sem tensões eróticas, é claro.

A produção de HP 7/1 lançou mão de toda essa intimidade, esse carinho e até correspondeu a alguma expectativa dos fãs mais ávidos por um pouco mais dos dois: que desta vez, não foram só os três de sempre, acharam lugar de ser dois: Harry e Hermione, sem Rony, sem nenhuma conotação sexual ou de outra coisa do gênero. Só queriam saber de ser eles dois. E tivemos uma "valsa" um tanto quanto engraçada e tivemos um beijo super caliente que, cá pra nós, é digno de um Movie Awards de Melhor Beijo do ano. 


Vi o filme na pré-estréa na madrugada de quinta para sexta, muita gente louca gritando, vibrando, aplaudindo e chorando (inclusive eu), e saí às duas e tanta da manhã a flutuar por Niterói feliz, feliz como nunca antes fiquei com um filme de Harry Potter. Confesso que sempre tive um queixa, alguma birra rabugenta com a adaptação, mas dessa vez, tive de me limitar a sorrir e permanecer encantado. O filme foi muito sensível para com as relações entre as pessoas e principalmente entre Harry e Hermione. 

Ora, àqueles que necessitam conhecer a música que Harry e Hermione dançaram, aqui vai uma dica http://mp3skull.com/mp3/nick_cave_o_children.html

A música se chama "O'children" e é do Nick Cave.

Termino este post sobre algo que amo com um dos pontos altos do filme, quando o Dobby nos braços do seu "Harry Potter" diz: "What a beautiful place..." enquanto contempla as maravilhas do por vir da liberdade.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Novidades!

Eu querendo escrever algo só para estrear o teclado novo que comprei, pra sentir a sua maciez, encomendo-me algo que fale sobre a novidade das coisas que compramos e o quão novas e empolgantes elas podem ser até que chegue o dia de serem postas de lado, ignoradas, banalizadas pelo uso e pela velhice inerente a tudo o que é novo.


Mas talvez, trezentos e trinta e um caracteres já sejam suficientes para envelhecer um novo teclado. E já não o quero mais, esvai-se a motivação, uma vez que era tão rasa. Deixemos de lado o novo teclado até que ele ganhe real razão de ser. Não posso fazer dele o que eu sou: um mero cumpridor de tarefas. Ele, como já disse antes, aqui, serve-me de escape, caminho de fuga e desfibrilador.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A Regra de Cinco ou Teorema Falho


O que vem depois da curva era o que Pocahontas queria saber. Ela tinha nos olhos a sede do desconhecido, sede de ir buscar e fazer, desbravar quanto mais fosse possível. Hei eu de questionar também da curva, mas me interessa saber o que virá quando eu te vir cruzando a sua curva. Quando suas costas forem dadas as minhas e não mais tivermos o hábito fundamental de resolvermos que decisão tomar, a que filme vamos assistir, que roupa devemos vestir, quando começaremos a nova dieta... O que haverá depois da esquina que nos separará e não nos dará mais espaço para discutirmos o futuro da humanidade, a estética literária vindoura, quando não mais for religioso nos embriagarmos com a vodka mais barata do supermercado mais pobre num dia banal e sem pretensão.

O que advirá no além curva que certamente nos tomará feito turbilhão e nos alquebrará e nos fará engolir a seco a descoberta de que o tempo todo fomos átomos e nos julgávamos tão inseparáveis, tão inquebráveis e nos vermos feitos em elétrons e prótons dispersos no moinho triunfante  que é o mundo, que há de destruir os sonhos mesquinhos, reduzindo a pó até o que se crê indivisível? 

E que curvas você vai tomar quando eu mesmo já tiver tomado tantas outras? Que novas crenças adquiridas vão fazer o favor de nos separar? Por que ideias vamos nos afundar no nosso hibridismo? E... a que distância você vai gritar por mim? E eu só preciso discernir sua voz a me chamar no meio da desgraça em que nos encontraremos, no meio da muvuca, da multidão de nossos dias, e lhe garanto um minuto de minha ausência, que será rompido com minha chegada em seu socorro. Lá estarei eu, munido dos outros três, com nossa tradicional Komaroff, uma kanga e um gramado nas costas, para que sentemos e possamos chorar as desgraças do advindo, rir os risos do presente e fantasiarmos as glórias do por vir. Aleluia! Havemos de ser nós tanto quanto as curvas se impuserem mais ainda. E seremos lindos. E seremos tantos, tanto mais que tudo. Três, cinco, dezenas de nós mesmos mergulhados num abraço coletivo e nosso. A literatura nos conta que não resolve marcarmos o chão com migalhas de pão. Havemos, assim, de ter GPS, irmãos.

Feliz Aniversário, Tamara! 

sábado, 19 de junho de 2010

Eu, Narciso meu e minha pena

Uma estância de mim

Escrevo:
- Para compreender a mim e a minha existência: ao passo que escrevo sobre algo, compreendo de dominá-lo, pois passa a ser meu domínio, e quase o esgoto por um instante.

- Para preencher minha alma: não tenho mais religião, não sei por anda Deus e preciso de alguma transcendência na minha vida. 

- Para desenhar possibilidades: imagino como seria minha vida, se certas coisas tivessem acontecido e projeto em personagens minhas ânsias para toda a vida. 

- Para emocionar-me: conforme escrevo ou leio o que escrevi, sou tomado de grande emoção, afinal me vejo frente a um espelho; como se eu estivesse sentado diante de minha própria alma.


Outra estância de mim

Publico: 
- Porque, no mínimo, sou acometido de alguma pretensão: creio que o que fala, fala sempre do alto de um pedestal; crê-se poderoso a ponto de ser merecedor da atenção de outrem. Julga que o que tem a dizer, pode surtir efeitos, salvar, libertar ou destruir seu ouvinte. Falar, tornar-se público, é um fazer de absurda pretensão. 

- Porque, se me julgo digno de ser publicado, creio-me merecedor da aplausos: há artista, ou pretenso artista que seja, que não anseia aplausos e vivas? Pois, por mais recluso que seja um artista, se ele expõe sua obra, já há nisso alguma vaidade. Gosto dos elogios, minha mãe e professoras me criaram assim. Aquele que não espera nenhuma glória e cria arte só para explorar-se, explorar a própria alma, não publicaria nada, engavetaria tudo e nem mostraria a ninguém, nem alimentaria desejo algum de que seus trabalhos fossem apresentados um dia, mesmo que postumamente. 
De fato, quando escrevo, me busco, me acho e logo me perco, mas acho-me em algum instante, ao menos. De fato, quando recebo pareceres elogiosos, me amo. Mas não me tome por inseguro: adoro alguma coroa, mas não amargo uma decapitação. Escrevo para me alimentar, publico para alimentar o meu Narciso. No fim, o Salomão da velhice e da loucura tem alguma razão quando fala sobre vaidade.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Mudança

Mudanças se fazem necessárias. Senão, a gente fica estagnado e se levando a sério demais com as certezas tranquilas... Não tomem este testículo como encorajamento para não comentarem no texto abaixo... Este só existe em função da mudança do Layout...

terça-feira, 8 de junho de 2010

Minha pena é de Edgar

Outras vezes, sonhos de não poderem ser sonhados. Daqueles, que uma vez sonhados, trazem-me a dor durante todo um dia. Amargo o acordar, eu. Ver-me outra vez tal qual estou, tal que dói em mim. Tal qual me vejo, projeção do que sou em algum estágio que nem me conheço. Ele não está do meu lado, mas volta a atazanar-me em sonhos outra vez e não são sonhos voluntários de eu estar acordado. São os sonhos que alma pede ao subconsciente que lha dê. Afinal, alma pode viver os sonhos, ela está no meio do absurdo que se desvenda e se faz e é seu plano, seu palco de ação.

Ela diverte-se na madrugada enquanto durmo, ela sorri, o abraça e o tem mais perto do que nunca antes. Edgar está lá outra vez. A alma clama por ele. Clama por seus olhos castanhos, só dele, clama pelo Edgar mumificado em meus pensamentos. E o subconsciente trafica para a alma em forma de sonho aquele entorpecente, restando-me a ressaca, a rebordosa de um dia seguinte todo de dores de não tê-lo. Ela curte sua gandaia e me deixa a conta do botequim. Sou eu quem sofre dos excessos da minha alma.

Edgar não me deixo. Ele fica em mim, permanece nos meus sonhos, mesmo quando estou dormindo. Absurdo! Minha alma carece do ideal do homem perfeito que desenhei e oportunamente tem o rosto dele e nada além do rosto, uma vez que não é real; e não passa de projeção. Mas, se sonho com ele, meu dia se torna cinza, como gosto do inverno! É a dor inerente a todo prazer. A conta no dia seguinte, a paga.

E ele nem existe, nem é alguém que se possa encontrar pela rua, mas em páginas, em películas, em ondas. Eu queria sentir Edgar, mas isso nunca se daria; por mais que, aqui, ele estivesse, ele não estaria. Há dois dele. O meu e o outro, de quem roubei o rosto e alguns traços do caráter. Só. O amor de minha vida imaginária, da hora de dormir, das horas de ignorar as conversas chatas. De todas as horas em que fechar os olhos e fingir um mundo era a melhor opção. Adoeço-me, e sou agente deste fazer. Adoeço-me. Adoece-me também Edgar, que não deixa de ser eu em socorro e resposta à desilusão de mim.



P.s.: “Pena¹: ... 2. Laminazinhade metal, terminada em ponta, que adaptada a uma caneta, serve para escrever ou desenhar.

Pena²: 1. Castigo, punição, penalidade. 2. Sofrimento, aflição. 3. Compaixão, dó. 4. Mágoa, tristeza. 5. Bras. Punição imposta pelo Estado ao delinquente ou contraventor.” (Aurélio Buarque de Holanda Ferreira)

P.p.s.: Foto: Caneta utilizada pela Princesa Isabel no ato da assinatura da Lei Aurea, que por sua vez libertava os cativos à escravidão.

sábado, 15 de maio de 2010

Escreve, invento, vivo


Escrever tornou-se meu vício e minha virtude, meu consolo e algoz. Minha chave e meu cadeado. É o que preciso. É o que mereço. Vezes, escrevo, não por querer ou por ter me vindo alguma ideia brilhante: escrevo porque me forço, me forço porque preciso. Me obrigo a sentar-me e extrair de mim algum lirismo, algum feito estético, alguma beleza na feiúra de meus dias. Juntar as palavras e dar-lhes o sentido que só podem ter juntas umas das outras e o sentido que só mesmo eu posso dar a elas...
Sou escritor? Sou “autor de composições literárias e/ou científicas” como define o avô da Miúcha? Desta vez, e é a única de que me recordo, acho que Aurélio pecou. Escritor é mais que isso. Seria mais adequado dizer que se trata de um ser doentio e doente, que vê, na pena, a única saída para sua dor, conflitos, desilusões. É na ponta de sua pena, dedos, teclados, que esse ser, amaldiçoado por sua maior dádiva, se vê livre e escravizado. É uma via de mão dupla, bem como a vida sabe ser. Toda dádiva tem seu carma. Todo carma, a sua delícia. Onde, então, deveria morar a delícia?
Toda vez que escrevo, debruço-me sobre o cavernoso dom de viver. E como é feio, dolorido, ou lindo. Há sempre que se extrair dúbios regalos, bons, ruins, maravilhosos ou podres. Escrever tomou conta de mim: vezes invento dores só pra escrever sobre elas, n’outras, invento as mesmas dores só pra dizer que estou vivo, que sinto, que choro por coisas que invento. Vezes, invento príncipes que me salvam e escrevo sobre eles para que salvem os personagens onde tenho espelhos. Mesmo os que não gostam de espelhos. Os tenho aos montes. Eu não gosto de espelhos. Acho que não gosto de mim. Gosto. Se não gostasse não estaria dizendo tão bem do que faço. Acho que não gosto de saber que gosto. Afinal, com a certeza de que gosto de mim, lá se vai mais uma dor da qual escrever; mas não gosto mesmo é de espelhos.
O, um dia, avô de Marieta Severo, deveria, então, ter dito, pra que se sacraliza-se, que o escritor é um bom filho da puta. Nisso se resolveria toda a dor de séculos de etimologias vazias e nomenclaturas descartáveis. A origem do escritor está em ser filho da puta, ora por ser desgraçado demais, ora por ser afortunado demais. Por precisar inventar dores, por gostar de inventar amores, por chorar por esses amores, por rir das mesmas dores. Um filho da puta fingidor, que finge completamente e finge que a vida é dor, pra que ela não tenha que doer de verdade o tanto que ela tem de ser doída...
Escrevo pra contar pra mim, histórias que eu gozaria se lesse. Ó, se vivesse. Escrevo também, para contar, aos outros, histórias que não sei como seriam reagidas. Escrevo. Eu escrevo pouco. Ninguém me perguntou se escrevo, o que escrevo, escrevo quanto. Ninguém me perguntou coisa alguma, se escrevo pretensiono um que leia. Óbvio e irrevogável! Escrevo para que alguém leia. Pra que eu exponha de mim, e consequentemente, expondo de mim, exponho a outrem, para que sinta também a dor, ou a farsa de dor que pareço sentir, o amor que gabo contar, a beleza ou a feiúra que jogo no papel.

sábado, 17 de abril de 2010

Fantasia - ar - ar-se


Deve haver grande diferença entre ver, querer e ser. Há um limbo entre estas três margens. Há algo que supre, que repõe, que substitui o vazio. Algo que pode iluminar de uma luz que bem domino. Tenho e faço uso. Fantasia.
Quando a vontade não é amiga da realidade, quando houve casamentos que não foram comigo, quando Evaristo Costa não passa de um âncora de jornal, quando Lucas é só pensamento, e Edgar já morreu em altares, existe a fantasia. O caminho de fuga, que me alegra e enche o peito. O caminho marginal, que vai beirando a realidade e quase me faz louco. O caminho da mentira, na qual me perco desesperado, ávido por alegria alguma que não faço encontrar enquanto pisam meus pés.
Se dói pisar, me sento e com os pés sobre almofadas de veludo vinho, leio um romance. Se o espelho me traz o choro, vou ao cinema, vejo a novela. Se a solidão me quebra os ossos, eu deito em cama quente, sob edredom gostoso e ponho-me a namorar. Vivo casamentos, vivo paradas de posse em primeiro de janeiro...
Quando o devir, por vir e o que veio não se entendem acho que vem-me a fantasia. Potência e ato não namoram mais. Não se vêem... Potência e desvario. Ato e desespero. Ter e ser, não mais me importam, construo o meu reino no habitat da loucura. O louco parece não querer as convenções, parece nem saber o que vem a ser aquilo do que lhe chamam. O louco é um rei. Rei da margem e da verdade de seus caminhos unicamente seus. A loucura não acampa o coletivo. Tampouco se importa com ele. A fantasia é louca, louca como a fada que a produz. Escapes entorpecidos. Absinto e vodka.
A fantasia me protege. Fantasio-me como Perseu usa um escudo. Fantasio por necessidade. Fantasio pra curar a dor dos calcanhares que inflamados do tanto pisar. Ah, fantasias... Tão minhas. Tão minhas... Tão minhas também serão as drogas que o psiquiatra me receitará já na primeira consulta... 


 Mickey Mouse: o mais suave traficante da droga mais agradável...
 

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Quase discurso do método: o poder medicinal do chocolate


Os dois primeiros parágrafos deste texto foram escritos minutos antes de eu comer um chocolate. Considero de grande importância destacar isso aqui e reutilizar esse trecho a fim de mostrar como o texto acabou tomando um caminho plenamente diferente do que eu pensava antes do chocolate.
Título idealizado pré chocolatinho: Of-LIFE, ou coisa parecida.
Levantar-se cedo e sair a fazer, a ser alguém ou a preparar o alguém que se virá a ser um dia. Acho que a vida não passa de um cumprir de tarefas agendadas mesmo antes de comprada uma agenda, mesmo antes de comprado um ser, mesmo antes de chegar a ter sido. Eu não queria incidir no piegas e perguntar mais o uma vez o que é a vida, mas já o estou fazendo. Quero não parecer infantil ou coisa do tipo com um questionamento tão tenro quanto este.
Parece que vivo pra atingir metas, chegar a lugares; sentar em cadeiras. É isso vida? Pleitear lugares de respeito? Quem sou durante o tempo em que persigo minha Cidade de Esmeralda?
Daí, fui à cozinha, pois a água do café estava fervendo (não suporto café de cafeteira, tem que ferver a água e usar o coador...). Então, lembrei de pegar um pedaço de chocolate, nada extraordinário de mais: Hersheys, por sinal. Voltei pro meu palco, digo, PC e, munido de café mordi um pedaço de chocolate e me foi impossível escrever coisa outra além de:
E vem-me o gosto do chocolate me tomando as noções da língua, e um café quente faz queimar o meu céu da boca, mas tudo vai começando a parecer melhor e Lily Allen que já estava no ouvido, vai se tornando mais audível com suas críticas suaves e engraçadas. A vida não tem sentido mesmo, tem? Ela não é um jogo, onde você tem de tirar no dado a sua profissão, pôr um pino no carrinho a cada filho angariado e nem virar um magnata no final. A vida, diferente do jogo, que se diz dela, não termina quando você se torna um magnata. Há o depois. Há o que vir no adiante. Deixar ser, deixar acontecer. Não ganha aquele que conta mais dinheiro, o tal que teve mais hotéis no Morumbi. Não ganha o dono da Av. Nossa Senhora de Copacabana. Não ganha o infeliz que vive caindo na prisão ou nas garras do leão.  
Talvez o vencedor seja aquele que teve de desenhar Lucélia Santos em “Imagem e Ação” ou aquele teve de fazer uma mímica de “A rosa púrpura do Cairo” ou de “O ultimato Bourne”. A vida é um jogo em que o vencedor é aquele que viveu, não o que correu atrás dela, ávido por ela e por se alguém dentro dela. Vence na vida, aquele que nunca pretendeu isso, assim como a Pedra Filosofal vai parar nas mãos de quem não almeja usá-la para benefício próprio. A vida talvez queira ser vivida sem a pretensão de seus viventes. Que dancem. Dancemos. Que pulemos! Comamos mais chocolates. E é bem isso o que devo fazer agora mesmo, acho que as endorfinas estão outra vez se aprisionando. O efeito chocolate é um mero paleativo e se vai, se esvai e me deixará só tão logo. Gostaria de assistir o “Conde de Monte Cristo” ou “Mudança de hábito”, vai ver seja preciso um “Jardim Secreto”.

domingo, 11 de abril de 2010

A ignorância sobre o hoje que já nos tomou no passado torna-se engraçada, uma vez calcados no terreno dos acontecimentos de agora. E nem sabíamos o quão enredados estaríamos nessa coisa estranha, confusa e angustiante que aprendemos a chamar de vida. E a gente não pôde dizer o que seríamos, onde estaríamos, com quem. A ignorância do que nos tornaríamos nos trouxe ao que somos, pois, afinal se pudéssemos antever, muito não seríamos então. Muito seria impedido. Muita dor seria podada já na essência. Muito seria evitado.

Uma vez aqui em cima, depois de certo e também longo caminho percorrido, nos damos com aquele de nós lá do começo: aquele de nós que ainda não tinha tamanho pesar. E torcemos, como quem acompanha uma montagem da Paixão de Cristo, para que façamos escolhas diferentes, que não tomemos aqueles caminhos, mas é um torcer inútil, estamos fartos de saber que o Cristo foi a cruz. Torcemos pela vitória num jogo reprisado, do qual já conhecemos a derrota.

E os próximos. A neblina do alto da montanha me impede de ver adiante. De saber o que é. Só posso contar com minhas aspirações, com o que quero que venha... E outra vez me pego ignorante, sujeito aos mesmos erros, aos mesmos resultados errôneos ou até certos, de alguém que se pudesse prever o adiante, no mínimo, faria algo para impedir parte dele.

terça-feira, 6 de abril de 2010

"At Waterloo [Dorothy] did surrender"


Sonhei que estava sonhando um sonho bom. Comigo, Feiticeira, armário, leão, homem de lata, espantalho, Totó. Eu: Dorothy, Lúcia, Alice. Eu era Godot e não vinha; eu era o mágico e ludibriava os outros com minhas histórias, com meu jeito de falar. Eu era Aslam e dizia tudo, e enchia o peito, o enchia de mim. Sei que era tudo sonho, que tudo era Literatura; eu sou Literatura. Tudo o que sou é o que escrevi. Sou pouco. Também sou o que li; também sou o que escreverei. Sou Milena, Lucas; sou Lean, sou todos eles e acho que serei Alana.
Eu sou Alice correndo atrás do coelho; sou Alice encarando a Rainha de Copas; sou Alice, uma nova vez, afogando-me em minhas lágrimas. Me perco no labirinto, no do Fauno, do Minotauro, no do Torneio Tribruxo. Me perco no tabuleiro de Xadrez de Bruxo, no tabuleiro de Jumanji. O negócio é me perder: nas letras e palavras, seus fonemas, sua música. Me perder também entre as porradas nas minhas teclas. Me perco nos olhares dos Lucas’s, no sorriso de Milena, nos suicídios de Alana. Alana sempre se mata. A cada novo conto ela acha um jeito de dar cabo de si. Ala é minha vontade. É a coragem que busco na Estrada de Tijolos Amarelos. A saída da loucura esteve sempre nos próprios pés. E posso sair do abismo no qual me meti. Eu tenho sapatos.
Quando percebi que eu queria ir à Nárnia, que eu, de fato, queria estar lá; quando me entristeci por entender que Nárnia não existe, me dei conta, como nunca, de que sou Literatura, e por isso nem existo. Sou apenas a sombra acordada e triste. Uma sombra frustrada, desenganada; nunca desencantada. Não há Nárnia, não há Hogwarts. Nada de Oz ou País das Maravilhas. Mas há Godot – nem que perdido em algum lugar, impedido de chegar. Há o mágico; Aslam persiste e Dumbledore me ama.
Se sonhei acordei desgostoso. Por que me tiraste o sonho? Por que despertaste-me? Justo agora que Herminone Granger e eu lutávamos contra o mal? Justo agora que Cristo me tomou em seu colo e me levou a uma procissão de travestires? Por que me roubaste  primo do Porco? Deixasse-me dormir. Sonhar, escapar da minha realidade fria e sem ação, emoção; sem cadeiras de prata, sapatos de rubi, sem desaniversário, sem Nimbus 2000.

domingo, 4 de abril de 2010

Eu mato a minha angústia no teclado


Eu mato a minha angústia no teclado
Pois esse é o único modo que sei de me deixar vivo.
É no teclado que eu mato tudo o que dói.
Ali, eu aperto, estouro, espremo:
Pus e secreções...

Eu mato a feiúra no teclado.
Tudo o que é feio não resiste ao contato dos meus dedos com ele.
Não resiste e se torna belo.
Eu dou vida a toda dor no teclado,
Pois do tanto que tento matar,
Não faço além de deixar escapar mais.
Eu mato a minha angústia no teclado
Porque ele é o único que pode suportar o peso de meus dedos
E o peso que jogo sobre ele.
Além do meu teclado, que outro ser se sujeitaria a formar tais sentenças?
Eu espanco o meu teclado pra não ter que espancar ninguém!
Eu me escondo atrás dele; o teclado me protege, me liberta para dizer
[o que a língua não consegue
Enrola, se perde. Louca!
E quando a angústia se alia ao tédio e escorrem juntos por mim inteiro
É o pobre do teclado que dispara a executar minha melodia doente.
Eu mato quase toda a minha angústia no teclado,
Por que calejado de apanhar, não se queixa do fardo de receber
Sobre si, constantemente, o peso da desgraça contida em seu eu.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Moinhos, o mundo e uma criança


Que decepção!: acordar de manhã e se dar conta de que toda maravilha vivida não passou de um sonho. Acordar e dar com a realidade debochando de você. Dizendo: “Besta. Acreditou nas falácias do seu subconsciente desesperado.” Agora, tudo é secura diante do nada que não chegou a existir. E se tinha tamanho tesouro nas mãos e agora não mais.

Não para mim! Acostumado às vias do devaneio, escapo! Vou! Fugindo pelas vielas do pensamento, Sobrinho de Mago que sou, atravesso Guarda-roupa, dou com Feiticeira, abraço Leão. Ando a Cavalo, brinco com seu Menino. Vislumbro um Príncipe, viajo com ele em seu navio, peregrinação na Alvorada. Descanso numa Cadeira de Prata, onde me preparo para encarar a Última Batalha. E a realidade quer me levar o brilho dos olhos, quer extinguir a última chama acesa em mim. O Nada levanta-se para devorar a minha Imperatriz Menina!

E me dói, a certeza de que cresço. Cresço e não posso mais alimentar-me. Alimentar os anseios de fuga, de heroísmos, de amores... Cresço e sinto arder meus pés. Eles não aguentam o peso de andar. E quando eu quase penso que sonhar não pode ser mais a minha praia, me vem Cartola, um paternal Cartola, com uma voz suave, carinhosa, me dizer que ainda é cedo, que mal comecei a conhecer a vida e que, mesmo resolvido, minha vida ficaria pelas esquinas. Ele me chama mais perto e me diz pra ouvir bem: “o mundo é um moinho”. Um moinho que tritura. Um moinho é capaz de levar um Quixote à beira do abismo. Retorno à querida Cecília, “não sei se saio correndo, ou se fico tranquilo...”

Cartola pai me pede para ficar, protegido pelo manto das ilusões, dos devaneios; a Cecília criança, se inquieta indecisa. Dom Quixote me mostra a morte que há em sair em busca de viver devaneios. Não sei se cresço ou se me escondo. Não sei vou ou se me resguardo. Não sei se faço sexo ou se leio Jane Austen. Talvez, ainda seja cedo, pai. Talvez seja já tarde.

Foto: Minha irmã, um pangaré de mentirinha e eu. No tempo que se tirava fotografias em praças nos bairros.

terça-feira, 23 de março de 2010

Verdade


Há algum tempo ando me questionando o que é a vida: o que viria a ser essa maravilha duvidosa e estranha a qual me sinto tão intimamente ligado e pelo que me sinto incondicionalmente responsável. Absurdamente longe de obter uma resposta, afinal descreio da existência de uma, andei por um caminho e outro até encontrar o que mais pudesse me servir de verdade.

Mas eu nunca aceitei muito essa idéia de que seja possível alimentar uma verdade que não seja comum a nenhum ser humano além de mim mesmo. Como posso carregar no peito uma verdade que ninguém assinou antes? Talvez o mistério esteja em não carregar, no peito, nenhuma verdade, pois quando a verdade ruir – o que sempre acontece – o coração estaria bastante vulnerável sem seu escudo protetor. A verdade, aquela que me consola, que me determina, me diz aonde ir e o que fazer, deve ser mantida à mão e sempre. Assim, ela estará sempre apta a ser descartada no advento de uma nova verdade ou renovado quando eu encontrar um jeito novo de vivê-la.

A verdade para a minha vida deve ser encontrada por nenhuma outra pessoa que não seja eu. Ninguém pode estar autorizado a decidir ou impor uma verdade a mim. A verdade de mim é um fera que só eu posso capturar. Uma verdade domesticada por outrem de maneira nenhuma se adequará a mim. Virá a mim cheia de falhas e de lascas desnecessárias, viria cheia de autoridade e requereria adequação de minha parte; mas a verdade encontrada por mim e para mim me cairá como uma luva. E não estou importando se ela é verdadeira, não! Não quero saber se Platão disse o contrário ou se Wittgenstein disse que não. Pode Buda ter dito outras coisas e até Cristo ter dito ser tudo de procedência maligna. Não é meu dever dar importância extremada ao que disseram antes. Minha verdade deve bastar a mim mesmo, num determinado momento, numa determinada necessidade, contudo, a minha verdade não pode ser manipulada por mim. Ela, apesar de minha, é autônoma. Ela tem seus caminhos: a mim coube achá-la não domá-la. Não sou seu adestrador, antes, seu arqueólogo que a procura, a pesquisa e a descarta em busca de novos achados.

terça-feira, 16 de março de 2010

Escape rápido da tarde

Acho que preciso, de fato, sumir. De tudo. De mim, de minha casa, vida, família. Não quero mais minhas responsabilidades, não quero mais as dores que viver me traz. Eu queria fugir para algum lugar de minha infância, onde tudo era inocência e simplicidade.

Queria, de novo, a era em que minhas atitudes, ínfimas como só elas eram, não desencadeavam coisa alguma em nenhuma outra parte do mundo, ou mesmo de mim. Quero mesmo é voltar a ver as coisas da maneira intransigente como uma criança vê. Tudo é o que eu penso e só o que eu penso e vejo pode ser verdade. O mundo todo é o que sei dele. Todo o mundo é meu pois só eu o percebo. Só eu o sei e ninguém outro pode mensurar o tamanho que ele tem para mim.

Há pouco queria me esconder entre palavras e pontuações de um texto barato. O fiz! Me esconder no refúgio do que acredito ser mais meu em todo mundo. Combinar letras, ajustar palavras... Canalizar meus pensamentos, as confusões em que me meto tentando amenizar minhas certezas. Eu as tenho, mas seriam dolorosas. Não sou confuso, mas cauteloso. Não sou sorrisos, mas uma máscara infundada e protegedora. Não sei, me escondo aqui, por que aqui tudo é meu. Só meu. Só eu entendo. Só eu sinto. Só eu quero entender e sentir.